Nos Tempos da Vaselina, a Pornochanchada
Posted: domingo, 27 de junho de 2010 by Victor Carvalho in Mesas: Comédias, Filmes, Nacional, PornochanchadaAlguns filmes são tão ruins, mas tão ruins que acabam ficando bons e engraçados. O passar do tempo também ajuda muito nisso. Tenho certeza que se tivesse visto esse filme na época em que foi lançado (1979), teria odiado, achado horrível, uma afronta ao cinema nacional (ou não... vai saber...). Mas olhando hoje, com uma mentalidade livre, parece fazer sentido. O visual do fim dos anos 70 e início dos anos 80. Corpos que de tão queimados de sol chegam a ser avermelhados. Mulheres torrando ao sol, não com filtros solares, mas com os famosos bronzeadores (quem nasceu na década de 80 ou antes e nunca viu alguém comprando um Cenoura&Bronze que atire a primeira pedra, ou o primeiro comentário). Aqueles corpos bezuntados em o que poderia facilmente ser óleo de cozinha. Os cabelos estilo Poodle. As calças atochadas até o inferno (revividas hoje pelos “queridos” emos). A eroticidade e bizarrice das produções nacionais dessa época. De certa forma, todos esses elementos juntos acabaram deixando o filme hilário. O humor, apesar de erótico, é bastante infantil, como na cena em que roubam as roupas de Onofre (João Carlos Barroso) com uma vara de pescar (!!!) enquanto ele vai para umas pedras escondidas “namorar” com uma mocinha.
Onofre é o típico caipira de piadas de fim de festa. Percebemos isso logo na primeira cena em que ele aparece, transando com uma bananeira “vestida” com um pôster em tamanho real de uma mulher. Nesse momento ele recebe uma carta de seu primo, que passou a morar no Rio de Janeiro, convidando-o para conhecer as maravilhas (mulheres semi-nuas na praia) da capital. O nosso jeca, então, veste a melhor roupa que tem, terno e gravata, e parte em uma jornada rumo a Ipanema. Eu, sinceramente, fiquei com medo de ir para o Rio de Janeiro depois disso. Engraçado como um filme nacional conseguia ser tão preconceituoso consigo mesmo. O jeitinho brasileiro velho de guerra é o que mais tem na cidade. Primeiro roubam a mala do coitado, depois um taxista malandro da gema leva todo seu dinheiro e, como se não fosse o bastante, ainda roubam suas roupas...
Meu amigo, se você for parar para analisar “criticamente” cada cena do filme, você tem vontade de voltar no tempo e esganar o diretor e escritor José Miziara antes de ele fazer o filme. Mas era a moda na época, até pelo motivo de a ditadura ter criado uma necessidade de cota de filmes brasileiros nos cinemas. Esse não é o único filme nacional nesse estilo. Se você der uma fuçada em filmes nacionais de comédia da década de 70, todos são assim. É a conhecida, falada por todos, porém não assistida Pornochanchada. O PPM (Peitos Por Minuto) do filme é um dos mais altos que já vi.
Pausa para falar do movimento da Pornochanchada: foi um gênero de filmes que permeou toda a década de 70 e o início da década de 80. Apesar de taxada de pornográfica, seus filmes não apresentam sexo explícito. Existem filmes com classificação 16 anos muito piores nos cinemas atuais. E sim, os filmes eram feitos para serem puramente comerciais. Os caras juntavam o que as pessoas queriam ver: sexo e cenas engraçadas (assim como a maioria das comédias fazem hoje em dia). E foram esses filmes que tornaram famosas grandes estrelas atuais: Sônia Braga, Vera Fischer (essa pelo visto nunca conseguiu largar o gênero), Xuxa (com o fantasma que a persegue até hoje Amor, Estranho Amor) e Antônio Fagundes. Dentre o supra-sumo do estilo, existiam as adaptações dos contos de Nelson Rodrigues, que considerava a si mesmo o “Anjo Pornográfico”. Se você viveu essa década, sabe muito bem do que estou falando. Se você nasceu depois dos anos 80, pode ter certeza que seus pais foram ao cinema ver filmes desse estilo. A conseqüência negativa da Pornochanchada foi justamente taxar os filmes brasileiros de eróticos e impróprios. Olhando para eles mais de 40 anos depois, parecem até mesmo inocentes perto de filmes como 9 Canções (9 Songs) e Calígula. E quem acha que o estilo foi criado no Brasil está muito enganado, a gente apenas copiava o cinema italiano. Se quiser saber mais confira essa entrevista com Cláudio Cunha, um dos maiores produtores da “Boca de Lixo” (onde eram feitos os maiores filmes do gênero).
As coisas não mudaram praticamente nada desde a década de 70. Antigamente, o rapaz de família levava sua namoradinha para ver Nos Tempos da Vaselina, hoje, o mano leva a mina para ver American Pie: Corrida de Nudistas (American Pie Presents The Naked Mile). E esse filme é o American Pie brasileiro. Depois de encontrar seu primo, Onofre, munido agora apenas de seu frasco de vaselina, vai conhecer as meninas de Ipanema. Meio sem querer, começa a espalhar uma lenda de sua virilidade e todas as mulheres querem provar um pouco do "gostinho do interior". Mas acompanhado sempre pelo Deus do Azar, o rapaz não consegue afogar o ganso. As situações mais bizarras acontecem para impedi-lo. Não é o melhor do gênero, mas diverte. A velha dica, esse filme fica bem mais engraçado se assistido em grupo. Mas tenha certeza de reunir pessoas com senso de humor, se você tiver algum metido-a-intelectual-paladino-da-castidade no seu grupo... meu amigo, você vai ter que ouvir... E não adianta dar cerveja para o coitado, esse tipo não costuma beber. Por sinal, compre umas caixas, vão ser um bom lubrificante para o filme (com trocadilhos).
Não encontrei nenhum trailer dele na internet, mas vale a pena ver esse quadro do programa Metrópolis, da TV Cultura sobre a Pornochanchada.
Ps.: apesar de as fotos estarem em preto e branco, o filme é colorido.
Link do Youtube
Muuuuuuuuuuuuuuuuuuuuito bom!!!! =D