Twin Peaks e a imortalidade da dúvida

Posted: domingo, 13 de fevereiro de 2011 by Victor Carvalho in Mesas: ,
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“Bem-vindo à Twin Peaks. Meu nome é Margaret Lanterman. Eu moro em Twin Peaks. Eu sou conhecida como a Log Lady (Mulher do Tronco). Há uma história por trás disso. Há muitas histórias em Twin Peaks, algumas são tristes, algumas são engraçadas. Algumas são histórias de loucura, de violência. Algumas são comuns. Ainda assim todas tem um pouco de mistério, o mistério da vida. Algumas vezes, o mistério da morte. O mistério da floresta. A floresta ao redor de Twin Peaks […] É a história de muitas pessoas, mas começa com uma, e eu a conhecia. Aquela que leva à todos é Laura Palmer. Laura é a escolhida”. E assim começa o primeiro episódio de Twin Peaks. Uma introdução da famosa e enigmática (como tudo na série) Log Lady. A personagem que provavelmente inspirou Johnny e Plank em Du, Dudu e Edu. A série foi uma das mais vistas em toda a década de 90, já foi escolhida pela revista TIME como uma das 100 melhores séries de todos os tempos, já ganhou o Globo de Ouro de melhor série de drama e a sua primeira temporada recebeu 14 indicações ao Emmy, dentre outros prêmios.

A série começa cada episódio mostrando a quantidade de habitantes da pequena cidade de Twin Peaks: 51.201. Ou seja, cada pessoa conta. E uma dessas pessoas é assassinada. Laura Palmer (Sheryl Lee). Linda, loira, “perfeita”, o orgulho da cidade. Quem matou Laura Palmer? Para responder a essa pergunta, Dale Cooper (Kyle MacLachlan em uma atuação simplesmente sensacional), agente do FBI, é chamado ao local. Entretanto, com o decorrer dos episódios, percebemos que o assassinato de Laura não é o único mistério da cidade. Todos os seus personagens escondem algum segredo. Todos são importantes. E todos são idiossincraticamente estranhos. Não é a trama policial, nem os dramas pessoais ou mesmo a comédia de humor negro que faz de Twin Peaks uma série tão genial, mas seus personagens. Todos são importantes. No fundo, no fundo, não existem personagens secundários. Todos são protagonistas de suas próprias histórias e, mais importante, de seus próprios segredos.

Pessoas são como aqueles doces estranhos que você encontra em um aniversário. Todo coberto de chocolate, bonito, tem cara que é bom. Mas você não tem a menor idéia do que tem dentro. Pode ser algo que você não goste. Ou pode ser o melhor doce de todos. Talvez mesmo depois de provar você não entenda o que tem dentro, o sabor ainda é estranho. Você só sabe que gosta, ou não. Por isso que não gosto de primeiras impressões. Ninguém nunca mostra quem realmente é na primeira vez. O processo de conhecimento é algo lento. Lento e divertido. Descobrir cada uma das idiossincrasias daquela pessoa, cada um dos seus segredos. E no fim... bem, não tem fim. Você nunca vai conhecer ninguém por completo. Anos podem se passar e aquela pessoa ainda te surpreender. E essa é a graça. Conhecer alguém não é sobre o fato, mas sobre o processo. O bom da maratona não é chegar ao final, mas percorrê-la. Quando você acaba de comer o doce, perde a graça. É como Dale Cooper fala logo no começo da série para o xerife local: “Harry, eu não tenho a menor idéia de onde isso vai levar a gente, mas eu sinto que vai ser para um lugar ao mesmo tempo bonito e estranho”.

Não existe o normal. Admitir que existe o normal seria admitir que todos são iguais, seria admitir uma verdade absoluta, uma certeza. A única certeza geral é a incerteza de tudo. Qual a graça de respostas? Odeio respostas. Elas são chatas e sem graça. A beleza está na pergunta, na dúvida, na incerteza, no novo, no segredo, no estranho. LOST. Melhor, o final de LOST. Eu, como a maior parte das pessoas, odiei, à primeira vista, o final de LOST. Mas depois eu percebi. Eu estava centrado demais nas respostas. Mas a série não é sobre respostas, é sobre perguntas. Respostas morrem, perguntas são imortais. A série inteira gira sobre isso, sobre a dúvida, sobre a beleza do não saber. Seria totalmente contraditório se ela acabasse respondendo tudo. O próprio nome já diz: LOST. Você a assiste para se perder, não para encontrar. Novas respostas apenas levam a novas perguntas. Assim era LOST, assim era Twin Peaks, assim é a vida.

Nós somos apaixonados pela pergunta, pelo mistério. Afinal, todo o ideal de religião é baseado na dúvida. A religião é uma tentativa de resposta para o mundo, mas ainda assim ela se baseia na fé, na dúvida. A dúvida foi o que criou não apenas a religião, mas a mitologia, a ciência, a filosofia. A poesia tem muito a nos ensinar, O poeta espanhol Ramón de Campoamor y Campoosorio diria que a dúvida é nossa eterna companheira. Alain, filósofo francês, afirma que a dúvida é o sal do espírito, sem uma pitada de dúvida todos os conhecimentos em breve apodreceriam. E foi justamente “a resposta” que apodreceu Twin Peaks. David Lynch (o gênio por trás de tudo) disse que ele nunca pretendeu dizer quem matou Laura Palmer. Mas a ABC o pressionou para que ele resolvesse o caso do assassinato logo na metade da segunda temporada. Resultado? Como o próprio Lynch disse, matou a galinha dos ovos de ouro. A audiência da série caiu vertiginosamente, o que acabou culminando em seu cancelamento. É como diria a Log Lady:

Eu carrego um tronco. Você acha isso engraçado? Para mim não é. Há uma razão por trás de todas as coisas. Razões podem até mesmo explicar o absurdo. Nós temos tempo para aprender as razões por trás do variado comportamento humano? Eu acho que não. Alguns tentam fazer isso. Eles são chamados de detetives? Assista e veja o que a vida te ensina.


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3 comentários:

  1. jéssica says:

    se pergunta fosse coisa boa, não viria nas provas da faculdade... ¬¬ hueuheuheuuheuheuheuhuheuheuh

    ai, ai... twin peaks... boa série! até hj tenho pesadelos com bob... =/

  1. Olá, Victor,
    Twins Peaks, realmente, foi uma série genial e o mistério não resolvido, (ou não resolvido de forma convencional) só serviu para aumentar o charme e a qualidade da obra, que em minha opinião é a melhor já produzida na televisão americana.
    Diferente de Lost que, em meu ver, as dúvidas deixadas no ar foram mais em virtude dos roteiristas estarem perdidos e não saber para que lado correr.

    Parabéns pelo Blog.

    Abs.

    Roberto

  1. Anônimo says:

    David Lynch owna neh, pena de quem nao o entende

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